terça-feira, 24 de agosto de 2010

Transporte e hospedagem grátis para participar das atividades em Brotas de Macaúbas e Ipupiara

Os interessados em ter transporte e hospedagem gratuitos para participar do II Fórum Direito à Memória e à Verdade e da 10ª Celebração dos Mártires em Brotas de Macaúbas e Ipupiara poderão se agrupar à caravana que sairá de Salvador no dia 15 de setembro (quarta-feira), à noite, e retornará para a capital no dia 18 de setembro (domingo) pela tarde.

As inscrições serão feitas exclusivamente por correio eletrônico. Quem tiver interesse deve fazer sua inscrição, enviando seus dados (nome completo, RG, CPF, profissão/ocupação, telefone, e-mail e celular) para eventolamarca2010@gmail.com.br, o  mais rápido possível, pois as vagas são limitadas.

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

Homenagem a Marilene da CPT




Por Ruben Siqueira 

Acabamos de enterrar Marilene, da CPT de Bom Jesus da Lapa (BA) há 32 anos. “Põe a semente na terra, não será em vão. Não te preocupe a colheita, planta para o irmão.” Nunca me pareceu tão verdadeiro este canto. As pessoas especiais têm uma relação especial entre o modo como viveram e o modo como morrem... Ela fez de sua vida plantação e os irmãos e irmãs vieram celebrar e oferecer a colheita.


Os últimos tempos de Marilene de Jesus Cardoso Matos foram de uma intensidade reveladora: de um espírito inquebrantável, ela não teve um corpo que, ainda sendo forte, sustentasse tanto destemor – a revolta das células de um câncer tão violento quanto inadmissível a matou em três meses. As agruras familiares, o assassinato do esposo Afonso, a prisão arbitrária, as dificuldades em conciliar o estudo e o trabalho, as incertezas da luta popular na atual quadra... tudo isso junto e em pouco tempo foi um coquetel da vida duro de engolir até para uma Marilene.
A numerosa reunião provocada pela celebração de seu passamento, viva eucaristia, foi outra revelação: além dos familiares, gente de longe e gente de perto, de todas as cores, vários credos, graus de instrução, a diversidade dos movimentos sociais, organizações populares do campo e da cidade eram expressão de 53 anos de vida e uns 35 de militância popular, pastoral, eclesial. Melhor os diziam os símbolos junto ao corpo tirado do aparato e simbolicamente plantado no chão do Centro Cristo Rei, em Santa Maria da Vitória, lugar-memorial das lutas sangrentas do povo do Oeste Baiano: flores, cactus, enxada, livros, água, lágrimas,  bandeiras dos vários movimentos (sem terra, quilombolas, atingidos por barragem, mulheres, educação do campo, PJMP, CEBs, reserva extrativista, fundos e fechos de pasto), fotos dos mártires locais da Causa do Povo, cartazes da Romaria da Terra e das Águas ao Bom Jesus da Lapa, da qual ela era considerada “mãe” e participou de quase todas as 33 edições, os cantos mais evocativos da Caminhada, os testemunhos dos amigos e companheiras, os velhos pais, as duas jovens filhas, o pote que por acidente se quebrou espalhando a terra e todos souberam interpretar... Marilene marcou com amor feito firmeza e carinho a vida de muita gente, dos camponeses em especial, do movimento popular, da Igreja, da CPT.


Mulher, negra, pobre, urbana, filha de pais lavradores de terra alheia, desacostumou-se a dar de graça o suor e desde cedo, nas CEBs, na PJMP, na CPT, pôs-se a suar na luta do povo, no caminho do Reino, na Romaria para a Terra Prometida. Forjada na adversidade, aprendeu na contracorrente a ser libertária. Jamais se dobrou ou contemporizou com os poderes, nem os opressores nem os falsamente libertadores.


A qualidade que mais admirava nela era a consciência de seu próprio papel como agente de pastoral, como educadora popular, como CPT – servidora fiel da libertação verdadeira. Sempre ponderada, chegava a ser intransigente quanto ao protagonismo e autonomia do povo nas decisões que a luta exigia. Rechaçava qualquer tentação vanguardista ou ameaça de manipulação da vontade e do sonho dos trabalhadores. Sofria com as desilusões políticas, as manipulações, as cooptações, o refluxo da luta do povo.

E vinha da fé profunda este proceder, não era metodologia, estratégia ou tática. As leituras bíblicas de sua última celebração o disseram: “Eu ouvi os clamores do meu povo, por causa dos seus opressores. Conheço seu sofrimento e desci para o libertar das mãos de seus opressores e para fazê-lo subir para uma terra fértil e espaçosa onde correm leite e mel “(Êxodo 3,7-8); “O Reino de Deus é semelhante a um grão de mostarda, que um homem tomou e semeou no seu campo. Embora seja a menor de todas as sementes, quando cresce, é a maior das hortaliças e torna-se árvore, a tal ponto que as aves do céu se abrigam nos seus ramos” (Mateus 13,31-32). De fato nem Javé nem Jesus fizeram concessões ao que não fosse a vida, a liberdade, a justiça, a solidariedade, a paz, construídas em amorosa parceria com a humanidade. “Quero cantar ao Senhor, sempre enquanto eu viver, hei de provar seu amor, seu valor e seu poder”.
Em 25/03/2010, ordenada pelo Juiz da Comarca, Eduardo Nostrani, deu-se a prisão dela e do presidente do STR João Sodré, apenas porque assinaram como representantes nota de denúncia das arbitrariedades deste juiz no caso da grilagem de terra nas comunidades geraiseiras de fecho de pasto de Salobro, Quati, Mutum, Jatobá, Pedra Preta, Brejinho dos Gerais, pelos advogados Paulo (ex-padre) e Socorro Sobral. A prisão injusta, ainda que sofrida, completou uma vida de irrestrita solidariedade à luta camponesa, tão criminalizada hoje.

Muitos viram na trajetória de Marilene também um alerta para cuidarmos mais e melhor da saúde, da relação com a família, o que implica em rever prioridades e ritmo de trabalho. Sem, porém – para continuar fiel a Marilene –, que isso sequer resvale para preocupações pequeno-burguesas, tão encontradiças hoje.

Ainda na última hora, sinal de contradição dos tempos cruéis que vivemos e nos interpela cruamente: no muro do cemitério duas faixas foram colocadas lado a lado. Uma do Partido dos Trabalhadores de Santa Maria da Vitória alegava “profundo pesar pelo óbito da nossa companheira”. A outra, tosca, posta por trabalhadores, dizia pequeno em desenhos quase infantis de flor e coração com a palavra “mãe” e “te amamos, Marilene”, e pedia bem grande “QUEREMOS JUSTIÇA”.

A comoção geral era dor pelas perdas várias e específicas, mas era também profundo agradecimento pela trajetória de vida e serviço de Marilene. Sejamos na luta, nos movimentos populares, na política, na Igreja, na CPT, na vida, dignos e dignas da companheira que hoje devolvemos à terra, que tanto queria repartida! Viva Marilene de Jesus, da CPT.

Participe das atividades em Brotas de Macaúbas, Buriti Cristalino e Pintada (Ipupiara)

Há 39 anos, no dia 17 de setembro de 1971 em Brotas de Macaúbas e Ipupiara, sertão da Bahia, foram assassinados o Capitão Carlos Lamarca, dirigente da VPR, e o Companheiro Zequinha Barreto filho de camponeses de Buriti Cristalino, onde alguns dias antes tinham sido assassinados na insana caça ao Capitão, o Companheiro Luiz Antonio Santa Bárbara, militante do MR-8 e o jovem Otoniel Barreto de 20 anos, irmão de Zequinha.

Há 10 anos a Diocese de Barra realiza nessa data a Celebração dos Mártires. Em 2009 realizamos o Iº Fórum Direito à Memória e à Verdade. O dia 17 de setembro, que já era feriado municipal em Ipupiara, a partir deste ano o é também em Brotas de Macaúbas.

Este ano, nos dias 16, 17 e 18 de setembro realizaremos o 2º Fórum Direito à Memória e à Verdade, juntamente com a 10ª Celebração aos Mártires, cujo programa segue abaixo.

Temos certeza de que quanto maior o Evento, maior será sua contribuição para a superação do trauma vivido pelas Comunidades, causado pela brutal repressão que sofreram.

Contamos com a contribuição de todos os Companheiros na divulgação do Programa e o comparecimento de todos os que batalham pelo Direito à Memória e à Verdade no que diz respeito aos companheiros mortos, desaparecidos e vítimas do arbítrio da repressão daqueles anos.

Convidamos a todos os companheiros de militância, Brotenses distantes, Ipupiarenses, parentes e amigos para estarem conosco nesse dia tão importante para todos os brasileiros.

Teremos, como no ano passado, transporte para Brotas e Ipupiara, saindo de Salvador no dia 15 de setembro (quarta-feira) ao meio dia, voltando no dia 19 (domingo), saindo de Brotas de Macaúbas às 08:30 da manhã, chegando em Salvador entre 16 e 17 horas.

Paralelamente à toda essa programação a Secretaria de Educação, Cultura, Esporte e Lazer de Brotas de Macaúbas está realizando um "Concurso de Redação com o tema "Direito à Memória e à Verdade" envolvendo todos os alunos da 5ª Série do ensino fundamental ao 3º ano do Ensino Médio das Escolas Públicas Municipais, do Colégio Estadual, além dos alunos do Cursinho Pré-Vestibular. A redação deve conter uma reflexão sobre a vida e a história dos heróis Lamarca, Zequinha Barreto, Luiz Antonio Santa Bárbara e Otoniel Barreto, e sobre os acontecimentos ocorridos durante a época da Ditadura Militar, que colocaram o Município de Brotas de Macaúbas em evidência no cenário nacional" (Edital do Concurso).

Pedimos a gentileza de confirmarem a presença o mais rápido possível, para assegurarmos vaga no transporte e hospedagem em Brotas de Macaúbas.

e-mail: eventolamarca2010@gmail.com

Fones: 71) 33670555 e 71) 91063774

Abraços a todos,

Sena e Roque

Programação Completa

2º FORUM DIREITO À MEMÓRIA E À VERDADE + 10ª CELEBRAÇÃO DOS MÁRTIRES

 
Dia 16/09/2010 – Quinta-Feira

 
10:00h. - Sessão Solene nas Câmaras Municipais de Brotas de Macaúbas e de Ipupiara:
  • Depoimentos de Companheiros de Lamarca, Zequinha e Santa Bárbara
  • Debate sobre os acontecimentos de 1971 na região com a participação de lideranças políticas e    sociais, professores, etc.
19:00 h – Mostra de Cinema com debate em Brotas de Macaúbas:
  • À LUZ DO DIA de Maria Sena
  • O MASSACRE DE BURITI de Maria Sena
  • MEMÓRIA DE UMA HISTÓRIA DE LUTA de Luis Mora
  • LEUCEMIA de Noilton Nunes
Dia 17/09/2010 – Sexta-Feira

 
09:00 h – Momento Celebrativo em Buriti Cristalino.

 
10:00 h – Inauguração do Centro de Memória Luiz Antonio Santa Bárbara em Buriti Cristalino, onde haverá depoimentos de Companheiros de Lamarca, Zequinha e Luiz Antonio Santa Bárbara.

 
14:30 h – Momento Celebrativo em Pintada.

 
15:30 h – Caminhada até o local onde foram assassinados os heróis Lamarca e Zequinha Barreto com o lançamento da “Pedra Fundamental” do Santuário aos Mártires.
  • Depoimento de Companheiros de Lamarca e Zequinha Barreto e Debate.
17:00 h – Homenagem à Companheira Marilene de Bom Jesus da Lapa.

 
20:00 h – Noite Cultural em Brotas de Macaúbas (Apresentação Musical)

 
Dia 18/09/2010 - Sábado

 
10:00 h  – Assembléia do Instituto Zequinha Barreto em Brotas de Macaúbas

 
14:30 h – Ato Político em Brotas de Macaúbas com a presença de Autoridades Federais, Estaduais e Municipais.

 
19:00 h – Mostra de Cinema com debate em Pintada:
  • À LUZ DO DIA de Maria Sena
  • O MASSACRE DE BURITI de Maria Sena
  • MEMÓRIA DE UMA HISTÓRIA DE LUTA de Luis Mora
  • LEUCEMIA de Noilton Nunes


20:45 h - Noite Musical em Pintada.
 
Dia 19/09/2010 (Domingo)

  
19:00 h - Festival de Música em Brotas de Macaúbas.

 

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

Atividades unificadas


No II Fórum Direito à Memória e à Verdade e a 10ª Celebração dos Mártires acontecerão, dentre outas atividades:

- Sessão solene nas Câmaras Municipais de Brotas de Macaúbas e Ipupiara
- Mostras de Cinema
- Momentos Celebrativos em Buriti Cristalino e Pintada
- Caminhada até o local do assassinato de Lamarca e Zequinha
- Depoimentos de amigos e companheiros de luta dos heróis acima
- Homenagem a Marilene da CPT (Comissão Pastoral da Terra)
- Apresentação da Orquestra Dois de Julho em Brotas de Macaúbas e Pintada
- Ato Político em Brotas de Macaúbas com presença de autoridades federais, estaduais e municipais

Logo, apresentaremos a programação completa!

terça-feira, 17 de agosto de 2010

Memorial Santa Bárbara será inaugurado em Buriti Cristalino


O Memorial Santa Bárbara será inaugurado em Buriti Cristalino, povoado de Brotas de Macaúbas. Este evento faz parte da programação conjunta do II Fórum Direito à Memória e à Verdade e da 10ª Celebração dos Mártires que acontecerá entre os dias 15 e 17 de setembro de 2010, Brotas de Macaúbas e Ipupiara. Nesta data, haverá a celebração da vida e luta de Zequinha, Lamarca e outros jovens que morreram em prol da vida do povo brasileiro.

Confira, em breve, a programação completa dos eventos que acontecerão nestes municípios baianos, a qual contará com: debates, mostra de filmes, concertos musicais e muito mais.

Quem era mesmo Lamarca? Confira biografia do capitão-guerrilheiro.

Carlos Lamarca nasceu no dia 27 de outubro de 1937, no bairro do Estácio, zona norte, do Rio de Janeiro. Seu pai Antonio Lamarca era sapateiro, e sua mãe Gertrudes dona de casa. Lamarca tinha seis irmãos. Desde criança era um homem decidido e sempre teve liderança nas brincadeiras com os outros garotos. Cursou o primário na Escola Canada e o ginasial no Instituto Arcoverde, ele foi o único dos filhos a chegar a Ter curso superior.

Em 1947, Carlos Lamarca ingressa na Escola Preparatória de Cadetes em Porto Alegre, e se mostra um cadete muito aplicado

Em 1957, foi transferido para Rezende, para Academia Militar de Agulhas Negras, na Academia Lamarca lê o jornal a “Voz Operaria” do PCB ( esse jornal era colocado debaixo dos travesseiros dos cadetes escondido), e começa a se simpatizar com as idéias comunistas.

Em 1958, Lamarca fica noivo de Maria Pavan, uma amiga desde a infância.

Em 1959 ainda aspirante e contra o regulamento, casa-se secretamente com Maria, que já esperava o primeiro filho. Lamarca e Maria vão morar no campo do Santana no Rio de Janeiro, no dia 5 de maio de 1960 nasce César Lamarca ainda em 1960 Lamarca é declarado oficialmente aspirante, e vai servir em São Paulo, no 4 Regimento de infantaria em Quitaúna, Osasco.

Em 1962 vai servir como segundo tenente nas forças da ONU, na ocupação do canal de Suez, no Oriente Médio, no Suez Lamarca começa a tomar consciência da pobreza do povo Árabe , e compara a situação do povo Árabe com a situação do povo brasileiro. Nessa época Maria Pavan já estava grávida novamente, a criança nasce em outubro de 1962 e se chama Claudia.

Em 1963, volta ao brasil, nesse momento as idéias comunistas vão ganhando mais força em Lamarca através da leitura de clássicos marxistas. Lamarca serve até 1965 na 6 companhia da policia do Exército, em Porto Alegre.

Lamarca considerava Leonel Brizola um autentico líder popular, admirou a sua tentativa de resistência no Rio Grande do Sul e deplorou a atitude de Jango considerando-a covarde. Lamarca jamais concordara com o golpe militar, e não suportava ser guardião de presos políticos, numa noite de sábado promoveu a fuga do Capitão da Aeronáutica Alfredo Ribeiro Dandt que era acusado de atividades subversivas, esse fato ocorreu em dezembro de 1964. Após a fuga foi aberto um inquérito para apurar os responsáveis , mas o inquérito não deu em nada. Após esse acontecimento Lamarca pede transferencia para o 4 regimento de Infantaria em Quitaúna.

Em Quitáuna Lamarca reencontra velhos amigos: o cabo José Mariane, o sargento Darcy Rodrigues, todos eles de oposição dentro do Exército. Em Quitaúna Lamarca organiza um clube, um local para que os militares de oposição pudessem discutir política dentro do Quartel. Mariane, Darcy e Lamarca estavam convencidos da necessidade de estruturar o foco guerrilheiro numa área rural. Lamarca se une ao grupo de revolucionários do 4 Regimento, e logo a rede política se expande e chega até outras corporações. Apesar da atividade política Lamarca segue a risca suas obrigações no exército, tornando se um oficial exemplar e se mostrando um excelente atirador. Perante aos soldados Lamarca era severo mas amigo, sempre procurando ajudar os soldados, e chegando até a emprestar dinheiro, mas perante aos outros oficias era o inverso.

Em 25 de agosto de 1967, Carlos Lamarca é promovido a Capitão, nesse ano ele retoma os estudos sobre marxismo, o trabalho político que desenvolve com os outros militares “revolucionários” vai prosperando, e a sua idéia de guerrilha se consolida em seus planos. Em 1967 Lamarca sente muito a morte de Che Guevara e diz “perdemos um dos maiores lideres internacionalistas mas a visa é assim ou se morre ou se vence. Che Guevara morreu, mas deixa sua semente, raízes que não morrerão”.

Em 1968 Lamarca procura uma organização que tivesse em seus planos deflagrar guerrilha e levar o povo ao poder. Entra em contato com a VPR (Vanguarda Popular Revolucionária), com Carlos Marighela ex- dirigente do PCB e principal comandante da ALN (Aliança de Libertação Nacional), e encontra-se também com a direção do PC do B.

Lamarca e o sargento Darcy ingressam na VPR em dezembro de 1968, Lamarca foi convencido pelos dirigentes da VPR que após roubar as armas do quartel a VPR teria um local para iniciar a guerrilha rural. O sargento Darcy desviava do quartel munição e granadas, já que ele falsificava documentos sobre o gasto de munição nos treinamentos. Três dias antes de Lamarca roubar as armas do quartel, militantes da VPR são presos, e pôr saberem os nomes de Lamarca, Darcy e Mariane os três resolveram tirar as armas do quartel imediatamente. Então no dia 24 de janeiro de 1969 Lamarca entra com sua Kombi no quartel de Quitaúna e retira 63 fuzis FAL, três metralhadoras INA e munição, em certo momento dois sargentos perguntam a Lamarca para que que as armas estavam sendo retiradas, e ele responde que é para um treinamento de tiro, messe momento Lamarca passa a viver na clandestinidade. Na verdade a VPR ainda não tinha condição de fazer a guerrilha, como havia dito.

Maria Pavan e os dois filhos saem do Brasil pôr segurança e vão morar em Cuba até 1969.

Após o roubo ao quartel Lamarca passa a viver em “aparelhos em São Paulo. Três meses após o roubo ao quartel Lamarca participa de sua primeira ação armada, essa ação ocorreu no dia 9 de maio de 1968, a VPR assaltou dois bancos o Mercantil e o Itáu ao mesmo tempo, durante o assalto Lamarca vê o guarda civil Orlando Pinto Saraiva apontar a arma em direção a Darcy, Lamarca então dispara e acerta a nuca do guarda. Mesmo participando da luta armada Lamarca desejava a guerra de guerrilhas no campo. A rotina de Lamarca se mantia, ele era obrigado a passar o dia todo escondido em apartamentos da VPR, com isso ele ocupa seu tempo estudando marxismo lendo sobre Trotsky, Lenin, Mao, Che Guevara, já que ele nesse momento ainda não possuía grandes conhecimentos teóricos. Lamarca enfrenta outro problema; além de não existir a área de guerrilha a, VPR a partir de janeiro de 1969 estava passando por um momento difícil após a prisão de vários militantes. Devido a crise a VPR convoca um congresso para se discutir as próximas ações, nesse congresso Lamarca é nomeado dirigente, ele aceita esse cargo a contra gosto, pois perseguia somente o papel de líder da guerrilha rural e não de uma organização tipicamente urbana onde seria obrigado a dar respostas a problemas não militares.

Já como dirigente Lamarca conhece Iara em abril de 1969, Iara era uma militante que passara por algumas organizações, e que no inicio de 1969 tinha a função de manter contato ente a VPR e a Colina Em junho de 1969 a VPR se une a Colina e forma VAR- Palmares, as duas tinham divergências mais possuíam um ponto em comum, a luta armada através da guerrilha. para uma futura união das duas organizações.

Lamarca e Iara se apaixonam, mas Lamarca tenta lutar contra esse sentimento, já que não seria justo com Maria que estava fora do país. Lamarca reluta em ficar com Iara, mas no meio de 1969 ele assume seu relacionamento com Iara e passam a viver juntos sempre que possível.

Após o assalto ao banco Lamarca comanda uma operação na casa da amante de Adhemar de Barros, um político completamente corrupto. Então no dia 18 de julho de 1969 Lamarca e seus companheiros roubam o cofre da casa, e quando o abrem vêem uma montanha de dinheiro, um total de 2 milhões e 500 mil dólares. Os militantes tiveram que trocar os dólares também no mercado negro, já que as casas de cambio freqüentemente eram vigiadas, cada militante recebeu 800 dólares para despesas, uma parte foi utilizada para preparar novas ações, uma fortuna foi gasta para manter os militantes na clandestinidade e 600 mil dólares caíram nas mãos da repressão.

Entre Julho e Agosto de 1969 se realiza o congresso da VAR-Palmares, desse congresso Lamarca , Iara e outros companheiros saem da VAR por causa de entre outros motivos a relutância da VAR em se dirigir ao campo para guerra de guerrilhas. Com isso Lamarca refunda a VPR absorvendo vários dissidentes da VAR, a nova VPR é fundada oficialmente no final de 1969.

A nova VPR compra um sítio no vale do Ribeira que seria usado para treinar os militantes para guerrilha, em janeiro de 1970 já havia chegado todos os militantes que receberiam treinamento inclusive Iara. Mas um sério distúrbio ginecológico hormonal fez com que Iara fosse obrigada a abandonar o campo de treinamento. Após o treinamento, o plano seria enviar alguns militantes para duas regiões do nordeste para desencadear a guerra de guerrilhas, mas a prisão de Mário Japa dirigente da VPR que conhecia a localização do sítio de treinamento, fez com que se desmobiliza-se parcialmente o campo de treinamento, já que Mário estando preso e sofrendo torturas poderia entregar o campo. Preocupados com a vida de Mário Japa a VPR decide seqüestrar o cônsul do Japão. Com o seqüestro, Mário e outros companheiros são soltos, mas a repressão continua a prender vários militantes, dois desses militantes delatam a área de treinamento. Lamarca ao saber da delatação inicia a evacuação da área , oito companheiros saem do campo de treinamento, nove permanecem, eram eles: Lamarca, os ex-sargentos Darcy Rodrigues e José Araujo Nóbrega, Gilberto Faria Lima, Ioshitante Fujimoto, Edmauro Gopfert, Diogenes Sabrosa, o ex-soldado Ariston Lucena e José Lavenchia. Os guerrilheiros estavam escondidos em áreas perto do campo principal. Lá pelo dia 22 de Abril já havia 1500 homens a procura dos guerrilheiros, havia vários helicópteros, aviões com pára-quedistas. José Lavenchia e Darcy Rodigues são presos pelo exército no dia 27 de Abril, os outros guerrilheiros continuavam a fugir, Lamarca e seu pequeno grupo se mostrara extremamente eficiente contra o exército. José Araujo Nobrega e Edmauro também são presos pelo exército.

No dia 8 de Maio, Lamarca num confronto consegue render um tenente, dois sargentos, dois cabos e doze soldados, e lê os termos de rendição para o tenente, 1- os guerrilheiros não fuzilariam ninguém, 2- os feridos seriam atendidos, facilitando o transporte dos mesmos, 3- os guerrilheiros apenas trocariam algumas armas sem expropriar nenhuma, 4-reabasteceriam de munição as armas, 5- O tenente levantaria o bloqueio do exército em Sete Barras (cidade próxima).

O tenente concordou com os termos só que não ordenou o levantamento do bloqueio, fazendo com que Lamarca e seu grupo caíssem numa emboscada. Os guerrilheiros conseguem fugir da emboscada e decidem executar o tenente, afinal, ele não havia comprido o acordo e não havia condição de prosseguir com ele naquela situação de cerco. O tenente deveria ser fuzilado mas para não fazer barulho o executam com uma coronhada de fuzil no dia 10 de maio.

Lamarca e seu pequeno grupo continuavam a fugir, começaram a fazer contato com os camponeses da região para obter comida e se impressionaram como eram bem recebidos na maioria das vezes, alguns camponeses que ajudaram o grupo de Lamarca foram mortos e torturados pelo exército. Lamarca decide que o companheiro Gilberto Faria Lima que não estava identificado pêlos órgãos de repressão deveria sair da região para buscar ajuda em São Paulo. No dia 30 de Maio Gilberto pega um ônibus para a Capital sem problemas.

No dia 31 de Maio Lamarca e seu grupo montam uma emboscada e conseguem capturar um veiculo do exército , fazem 5 prisioneiros, sendo um sargento e quatro soldados, os guerrilheiros vestem os uniformes dos prisioneiros e conseguem passar pelo bloqueio do exército sem problemas, e seguem para São Paulo, ao chegarem a São Paulo abandonam o caminhão e deixam os prisioneiros amarrados na caçamba.

Lamarca e seu grupo conseguem incrivelmente escapar do Vale da Ribeira, mesmo sendo perseguidos pôr milhares de soldados, sendo bombardeados pôr aviões. Essa vitória prova que um pequeno grupo se movimentando rapidamente, com tática de guerrilha é extremamente eficiente.

Após a fuga no Vale do Ribeira, Lamarca encontra sua organização em crise devido a prisão de vários militantes.

No início de junho de 1970 o Conselho Permanente de Justiça da 2° Auditoria Militar de São Paulo condena Lamarca a revelia a 24 anos de prisão pelo roubo de armas do Quartel de Quitauna, condena o ex-cabo Mariane a 12 anos e o ex-sargento Darcy Rodrigues a 16 anos.

Devido a situação difícil que passava a VPR, ela decide junto com a ALN realizar mais um seqüestro . O seqüestro foi realizado no Rio de Janeiro. Alguns militantes cercaram o carro do embaixador da Alemanha Ocidental e o seqüestraram. No dia 12 de junho, o dia após o seqüestro o presidente Médici e os ministros da justiça militar e das relações exteriores decidem aceitar parte das exigências dos seqüestradores , Os militares permitem que seja publicado na imprensa um manifesto dos militantes de nome “Ao povo brasileiro”. No dia 13 de junho o governo concorda com em libertar presos políticos, e dois dias depois um avião levanta vôo levando 40 presos políticos para a Argélia, entre os presos libertados estão: José Lavenchia, Darcy Rodrigues, José Araújo Nobrega e Edmauro Gopfert.

Em Setembro de 1970 Lamarca vai para um aparelho no interior do estado do Rio, Lamarca ainda acreditava na guerrilha, mas estava muito preocupado com o crescente numero de companheiros presos e torturados, também percebia que grande parte do povo não estava preocupado com os presos políticos e com as torturas que eles sofriam, o trabalhador explorado continuava submisso e calado.

No dia 7 de Dezembro de 1970, Lamarca comanda o seqüestro do embaixador suíço Giovanni Enrico Bucher, no bairro de Laranjeiras no Rio de Janeiro, no momento do seqüestro o agente de segurança Hélio Araújo de Carvalho é ferido e morre no hospital, o motorista é dominado e os militantes levam o embaixador para o cativeiro. A VPR faz as seguintes exigências para libertar o embaixador: O governo deveria soltar 70 presos políticos, divulgar textos de propaganda e distribuir gratuitamente passagens nos trens do subúrbio até o final das negociações. Mas dessa vez o presidente Medici endureceu e só concordou em libertar os presos políticos, a VPR manda várias listas com os nomes dos presos que deveriam ser soltos mas o governo não concorda em libertar alguns presos citados. A nova estratégia do governo surpreende a VPR que só tinha duas opções: aceitar as condições do governo ou matar o embaixador. A maioria decide matar o embaixador, mas Lamarca é contra porque matar o embaixador iria repercutir mal junto ao povo e afinal se deixaria de libertar 70 companheiros que estavam sofrendo todo o tipo de tortura nos porões da ditadura. Então Lamarca como comandante da operação diz: “Sou o comandante da ação, decido eu. Não vamos matar Bucher.”

Após se chegar a um acordo a cerca dos presos que seriam libertados, 70 presos políticos partem no dia 16 de janeiro rumo ao Chile de Allende.

Após o fim do seqüestro Lamarca e Iara passam uns dias morando juntos, a decisão de Lamarca de não matar o embaixador é o estopim para uma série de discussões dentro da VPR. A VPR queria que Lamarca saísse do país já que ele era o homem mais procurado, mas Lamarca não aceita e permanece no Brasil.

No dia 22 de março de 1971 Lamarca rompe com a VPR e entra para o MR-8, Lamarca gostava de todos da VPR mas politicamente considera a VPR muito vanguardista, negava qualquer espaço para o povo e não via como mudar essa situação por isso entra para o MR-8, Iara o acompanha. No MR-8 Lamarca via novamente a possibilidade de ir para o campo, implantar o foco guerrilheiro e levar o povo ao poder, o MR-8 reservava ao povo um papel no processo revolucionário, isso foi um dos motivos da aproximação de Lamarca.

De repente o MR-8 começa a ruir, no dia 14 de maio Stuart Edgard Angel de 27 anos, membro da direção do MR-8 é preso e levado para a base aérea do Galeão, lá é torturado de todas as formas para dizer a localização de Lamarca, apesar das torturas Stuart não o entrega. Stuart morre após ser amarrado na traseira de um jipe da Aeronáutica e ser arrastado de um lado para o outro com a boca no cano de descarga do jipe, Stuart morre asfixiado e intoxicado pelo monóxido de carbono. Os oficiais que participaram do assassinato de Stuart eram o Brigadeiro Burnier, Carlos Afonso Dellamara comandante do CISA, os tenente-coronel Abílio Alcantra e Muniz, o capitão Lúcio Barroso e o major Pena, todos do CISA., Alfredo Poeck capitão do Cenimar e pelo agente do Dops Jair Gonçalves da Mota.

Neste momento o MR-8 estava cercado no Rio de Janeiro e Lamarca e Iara estavam correndo perigo, então os dois partem em direção a Bahia ( Iara consegue vencer a resistência da Organização em deixa-la ir junto com Lamarca já que não se sabia como absorve-la no trabalho no campo. Lamarca e Iara chegam a Bahia mas não ficam juntos, Lamarca se dirige a Buriti Cristalino e Iara a Salvador.

No dia 29 de junho de 1971 Lamarca chega a área de campo em Buriti Cristalino, e fica escondido no meio do mato, somente recebendo visitas de companheiros do MR-8 que levavam sua comida, esses companheiros já estavam na região fazendo um trabalho de conscientização e educação com os camponeses. No dia 30 de julho Lamarca e seus companheiros discutem sobre a região e sobre as perspectivas de atuação, e percebem que seria um erro fazer a guerrilha ali, era necessário que a região tivesse alguma importância econômica para que a ação pudesse abalar o governo, e todo aquele agreste não tinha nenhuma importância para o país. Então ficou decidido que ali só se faria um trabalho de conscientização, recrutamento e formação de militantes de origem camponesa para mais tarde serem deslocados para uma região mais favorável a guerrilha..

No dia 6 de Agosto o militante Zé Carlos do MR-8 é preso em Salvador e fica a duvida se ele entregaria o local onde estava Lamarca e Iara, Zé Carlos é torturado mas não fala tudo de uma vez, fala sobre onde estava Iara porque achava que ela já tinha ido para Feira de Santana mas estava enganado, no dia 20 de agosto de 1971 os militares envadem o prédio onde estava Iara, prendem o companheiro Jaileno e outras pessoas, Iara parecia estar salva mas um menimo a vê com duas armas e avisa aos militares, Iara fica presa num quarto porque o menino que a viu bateu a porta e a porta só abria por fora, acuada, sem chances de escapar se suicida com um tiro no meio do peito.

Com a morte de Iara os militares tem certeza que Zé Carlos sabia onde estava Lamarca, e ainda possuíam o diário de Lamarca que falava da região onde estava. Em cima das informações de Zé Carlos e com o diário da Lamarca nas mãos, os agentes vão mapeando a região.

Lamarca e os militantes ficam sabendo que Zé Carlos estava preso, e mesmo sabendo dos riscos em permanecer em Buriti Cristalino resolvem ficar porque não podiam abandonar todo o trabalho que estava sendo feito com o povo da região, por precaução montam vários táticas de fuga caso fosse necessario.

No dia 28de Agosto os militares e policiais chegam a Buriti Cristalino, Olderico, militante do MR-8, percebe que tudo havia sido descoberto e quando os militares ordenam que todos saiam das casas ele começa a atirar para que Zequinha e Lamarca que estavam no acampamento ouvissem os tiros e fugissem, a atitude corajosa de Olderico deu certo ao ouvirem os tiros no vilarejo Lamarca e Zequinha fugiram pela Caatinga. Olderico é baleado. Buriti Cristalino foi palco do terror com a presença dos militares e policiais na região, vários camponeses foram torturados e espancados a troco de nada, animais dos camponeses foram fuzilados só por diversão, o militante Otoniel foi morto. Os militares continuavam a perseguição a Lamarca, este estava muito doente o que dificultava sua locomoção, o próprio Lamarca dizia para Zequinha o largar e fugir mas Zequinha respondia que "Quem é amigo na vida é amigo na morte!".


No dia 17 de Setembro Zequinha e Lamarca estão descansando embaixo de uma arvore, já haviam percorrido mais de 300km em fuga, quando Zequinha percebe que estão cercados, ele então grita para Lamarca " Capitão os homens estão ai", Lamarca não tem tempo nem para atirar, é fuzilado pelo Major Cerqueira, Zéquinha corre ainda alguns metros mais também é morto, antes de cair Zequinha grita: "Abaixo a ditadura!". O corpo de Lamarca e Zequinha são levados para Brótas de Macaúbas onde são jogados num campo de futebol para todo mundo ver. Os Agentes se divertiam dando chutes nos cadaveres, rindo e dando gargalhadas de felicidade.


Fonte: http://www.angelfire.com/de2/cheguevara/lamarca.htm, acesso em agosto de 2010.

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Direito à memória da luta no Sertão contra a ditadura: Lamarca e Zequinha Barreto



Por Eduardo Sá

O centro de Brotas ficou movimentado durante o evento. Na Cooperativa Agro-Mineral Sem Fronteiras (CASEF) ocorreu a 1ª Assembléia Geral do Instituto Zequinha Barreto. Quando a noite chegava, muita poesia e música da região, além de clássicos como Aquarela do Brasil. O cinema também marcou presença com a exibição de filmes como Porta de Fogo, do cineasta Edgard Navarro, sobre a morte dos guerrilheiros. Houve também uma atividade em Pintada, vilarejo em Ipupiara, onde Lamarca e Zequinha Barreto foram assassinados durante uma operação comandada, na ocasião, pelo major Nilton Cerqueira, do DOI-CODI. A comunidade Buriti Cristalino, local invadido na época pelas tropas de Sérgio Paranhos Fleury, do DOPS de São Paulo, também recebeu a visita dos participantes. Lá ocorreu um massacre em 28 de agosto de 1971, uma das etapas da Operação Pajussara, que resultou na morte e tortura dos familiares de Zequinha Barreto. Foi inaugurado o Centro de Memória Prof. Roberto, na casa de Luis Antônio Santa Bárbara. Este militante virou educador em Buriti e se matou no meio do massacre. A antiga casa de José Carlos Barreto, cruelmente torturado e preso por ser pai de Zequinha e não delatar o filho às forças policiais, agora abriga o Cine Clube Lamarca. O prefeito Litercílio Júnior (PT) deu boas vindas às diversas autoridades numa manhã ensolarada em Brotas de Macaúbas, dia 19 de setembro. A feira tinha acabado de ser recolhida na praça, quase todos os moradores da cidade estavam presentes quando ministros, parlamentares e líderes da região chegaram ao local. Jovens estenderam uma faixa em defesa do pré-sal em frente ao palanque. Estava um sol de rachar, ao meio dia.

O palco ficou cheio de autoridades, cerca de quinze. Entre elas o ex-ministro e ex-governador da Bahia, Waldir Pires; Franklin Martins, ministro da Secretaria de Comunicação da Presidência da República; Nilmário Miranda, presidente da Fundação Perseu Abramo, representando o ministro dos Direitos Humanos Paulo Vannuchi; os secretários de estado Nelson Pellegrino (justiça, cidadania e direitos humanos), Walter Pinheiro (planejamento), Afonso Bandeira (desenvolvimento urbano); alguns deputados
federais, estaduais e prefeitos, vereadores e líderes das cidades no entorno.

Litercílio destacou: “Talvez esse seja um dos atos mais importantes do município”. Para ele, as pessoas que foram tratadas como terroristas morreram em busca da igualdade e justiça desse povo. Por isso, foi decretado um projeto de lei que confere ao dia da morte dos guerrilheiros um feriado municipal.

“Por aqueles que lutaram por uma sociedade mais justa. Brotas tem uma dívida tanto com a sociedade quanto aos nossos companheiros”, complementou o prefeito. Afirmou também que agora as pessoas vão ter um novo tempo, no qual poderão expor sua liberdade política e participar na construção do município que desejam.

Roque Aparecido, um dos produtores do evento, lembrou da importante participação da igreja católica com as comunidades eclesiais de base ao celebrar os mártires. Também nesse sentido, Yulo Oiticica, da Comissão de Direitos Humanos da Assembléia Legislativa da Bahia, afirmou que Lamarca e os guerrilheiros “não são os demônios que eles querem pregar e sim os santos que eles querem negar: eles não trazem a verdade absoluta, mas o discernimento, a consciência crítica.”

Olderico Barreto, irmão de Zequinha e sobrevivente do massacre em Buriti, retomando os elogios à igreja reverenciou o Bispo Dom Luiz Cappio, que fez greve de fome pela não transposição do Rio São Francisco. Recentemente, Cappio ganhou um prêmio a Alemanha e está em busca de fazer um santuário no local da morte de Lamarca e Zequinha.

O jornalista que escreveu a biografia de Lamarca, Emiliano José, hoje deputado federal, ressaltou que talvez a maior crueldade feita pelos militares tenha sido pendurar o pai de Zequinha, José Barreto, de cabeça para baixo e torturá-lo em busca de informações. “Desse homem e sua família, que tem valores extraordinários, não podemos nos esquecer nunca”, declarou. Por isso, Emiliano defende que os assassinos também devem ser lembrados para que sejam julgados e condenados.

A luta por anistia e reparação a essas famílias também foi lembrada por outros presentes. Dadá Ferro do Vale da Revolução, agente cultural da prefeitura de Brotas de Macaúbas, foi enfático nessa questão:
“Que anistia é essa que garante a impunidade para o esquadrão da morte? Quem é que vai resgatar o trauma coletivo? Quem vai nos restituir a glória? E o trauma da dona de casa, do humilde trabalhador rural, dos jovens abalados pela brutalidade da repressão? Queremos cultura! Queremos resgatar as décadas perdidas!”, discursou.

Pessoas locais dizem que na operação Pajussara, a população de Buriti Cristalino foi retirada de suas casas com socos, pontapés e coronhadas de revólveres, fuzis e metralhadoras. Todos, inclusive crianças, foram conduzidos para a praça central do pequeno povoado e obrigados a assistir calados a um filme de terror. Animais foram mortos a tiros.

“Vocês estão assistindo uma celebração de natureza enorme por aqueles que lutaram por uma sociedade justa, legítima e generosa”, afirmou o ex-governador baiano Waldir Pires. E complementou: “Existe uma democracia formal, mas que não assegura a vida de todos os indivíduos, por isso Lamarca lutou. Nessa ocasião, se compreendeu no mundo que quando os direitos humanos não fossem cumpridos ou respeitados por qualquer tirania deveria suceder uma resistência de qualquer cidadão em nome da humanidade”.

O ministro Franklin Martins foi o último a se pronunciar, encerrando o evento. Primeiro, reverenciou aqueles que foram seus companheiros, como Santa Bárbara, Darcy Rodrigues e Marighela. Ao recordar sua experiência na militância contra a ditadura, o ministro observou que os militares queriam não só matá-los fisicamente, mas também moralmente.

“Isso não ocorreu, tanto é que hoje estão todos nas ruas resgatando essa memória, ao contrário dos seus inimigos que têm vergonha de ir à praça pública relembrar seus feitos. Essa é uma homenagem muito justa”, finalizou. Antes, fez longos elogios ao governo Lula, o comparando ao de João Goulart, presidente antes do golpe militar de 1964.

O irmão de Zequinha, Olderico Barreto, que sobreviveu ao massacre, protestou: “Matam nossos irmãos e vêm com a mídia para matar nossa alma, essa é a maior crueldade do regime”. Ele lembrou do difícil processo de desmitificação junto à população local na época. “Lia notícias dos jornais e perguntava às pessoas: Zequinha te roubou? Te fez alguma coisa? Mostrava que não se tratava de terroristas”, recorda.
Para ele, a região não é mais a mesma. “Nós não estamos cobrando justiça, queremos a verdade”, ressalta. A Assembléia Geral do Instituto Zequinha Barreto foi realizada na cooperativa dos garimpeiros da região, logo após a exibição do filme Porta de Fogo do cineasta Edgard Navarro. “Trata-se de uma entidade para desenvolver o trabalho político na região, porque aqui nessas distâncias as atividades normativas não são freqüentes e é muito importante formar bases administrativas e o resgate da história”, ressaltou Roque Aparecido, presidente do Instituto em Brotas.

Em setembro de 2008, Roque foi com Dona Generosa, outra liderança da região, a Osasco, na matriz do Instituto Zequinha Barreto. Na assembléia de fundação da entidade em Brotas, as pessoas que assinaram a ata no final, também assinada pelos ministros, tornaram-se sócios honorários do Instituto.

Roque lembrou que é preciso dizer não à mentira, à injustiça e tortura. “Precisamos de direitos, dever e justiça”, finalizou. Referiu-se ao legado da família de Antônio Carlos Magalhães, o ACM, como “entulho autoritário”.

A sede do Instituto fica na praça central de Brotas de Macaúbas, antiga sede do PT no município. É lá que funcionará um cine clube. Um grande avanço, já que apenas 8% dos municípios brasileiros possuem sala de cinema. Em Buriti Cristalino, também foi aberta uma extensão do Instituto.



quinta-feira, 12 de agosto de 2010

Saiu no A Tarde: Lamarca é lembrado com feriado em Brotas de Macaúbas



O ex-guerrilheiro e capitão do Exército Carlos Lamarca foi homenageado neste sábado, 19, com um feriado municipal em Brotas de Macaúbas, a 600 km de Salvador, onde ele se refugiou antes da sua morte, no dia 17 de setembro de 1971. Em ato político na praça da cidade, com a presença do ministro-chefe da Secretaria de Comunicação Social, Franklin Martins, e outros vários ex-militantes da luta contra a ditadura militar (1964-1985), o prefeito Litercílio Júnior (PT) sancionou lei aprovada dias antes pela Câmara Municipal.
A partir do ano que vem, o trabalho é facultativo no 17 de setembro nesta cidade do semiárido baiano. Assim como Lamarca, José Campos Barreto, o Zequinha, natural de Brotas e personagem que morreu ao lado do guerrilheiro, também foi homenageado. “É uma justa homenagem àqueles que lutaram por uma sociedade digna e mais justa. Durante quase 40 anos tentaram esconder e apagar essa história. Fazemos isso para instituir um dia de reflexão sobre o que cada cidadão deve fazer para contribuir pelo bem da sociedade”, disse.
Já o ministro Franklin Martins se disse emocionado de participar das homenagens e encontrar diversas pessoas que compartilharam dos seus ideais. “Vejo aqui que, mais de 30 anos depois, a história que tentaram matar, não conseguiram. Ela continua viva aqui. Esse feriado mostra que isso não é uma coisa de político, é uma coisa entranhada no povo da região, que sofreu muito na época. E isso é muito bonito”, falou.
Martins se liga à história de Brotas pelo ex-militante Santa Bárbara, morto também no município em agosto de 1971. “Ele era estudante secundarista de Feira de Santana e militou junto comigo. Eu aproximei o grupo de estudantes secundaristas da Bahia com o grupo dos universitários do Rio que lutavam contra a ditadura. Fiquei dois meses em Salvador, eles se fundiram conosco, e Santa Bárbara era um deles. Foi quando o pessoal secundarista entrou para o MR-8”, lembrou. Nesse périplo de militância, Santa Bárbara decidiu se abrigar na casa de Zequinha no início de 1971, de onde saiu morto.
Merecimento - “Lamarca nunca foi terrorista. Ele sempre lutou contra o terrorismo instalado pela ditadura, que rasgou a Constituição, depôs o presidente e fechou o Congresso. Ele lutou pela liberdade, pelo socialismo, um homem que merece todas as nossas homenagens”, completou Martins.
O ex-militante Adelmi Jacó Modesto relembra as ações de roubos de armas ao lado de Lamarca e ficou emocionado com as homenagens. “Acho que esse evento é o mais importante em termos políticos no Brasil para os militantes de grupos armados da esquerda daquela época”, disse.
As homenagens, no entanto, não comoveram toda a população de Brotas. Para muitos, a ida de Lamarca para lá só levou terror e medo. É o caso do aposentado José Carlos Oliveira. “Para mim, não vai ser feriado. Como é que o governo manda três mil soldados para cá? Ou eles eram muito perigosos ou eram bandidos de grande periculosidade”, disse, citando Lamarca como o autor do maior roubo de armas do Exército e Zequinha como o sindicalista que ameaçou explodir uma bomba numa indústria paulista.

Fonte: Jornal A Tarde